Vista atual do Parque São Lourenço, a frente lago do rio Belém e chaminé da antiga Fábrica de Adubos
Boutin ao fundo.
Um pequeno rio chamado Rio Belém corre no vale entre o São Lourenço e o Passeio
Público. Rio pequeno e sinuoso. Uma estradinha margeava esse rio. Estradinha estreita
e lamacenta. Em alguns trechos, pequenos córregos atravessavam-na, obrigando o
viajante a passar a vau. Era a então estrada do Assungui. O local São Lourenço era um
imenso charco rodeado de pequenas colinas. Esse charco, que o povo chamava de
“banhadão” era coberto de vegetação aquática que, durante a primavera cobria-se de
flores brancas. Mas quando chovia muito, virava lagoa, enchendo o rio que
transbordava em quase toda a sua extensão, até o outro charco, onde mais tarde surgiria
o Passeio Público. [1]
Nessa época ainda eram comuns as matas por toda a encosta do vale, pinheiros e outras árvores nativas, grandes e pequenas chácaras onde se cultivava agricultura de subsistência. Vários caminhos estreitos interligavam os sítios, nesses caminhos andavam pessoas a cavalo que iam em direção à cidade.
Na região do atual Parque São Lourenço havia apenas uma venda ou armazém com pouca variedade, a Dona Francelina Machado nos conta que “era uma casa de alvenaria situada a cerca de 300 metros do charco, em direção à cidade”. [2]
Um fato curioso que marcou a história da Estrada do Assungui, na região do São
Lourenço, onde a Rua Mateus Leme cruza a João Gava, às margens do Rio Belém, ali onde hoje
está o supermercado Mercadorama, é que neste cruzamento projetou-se a construção da
penitenciária pública de Curitiba. Houve inclusive, em 1880, a inauguração da pedra
fundamental do edifício, por Sua Majestade, o imperador D. Pedro II. [3] No entanto, alegou-se
que devido à falta de condições financeiras da Província, a cadeia não poderia ser construída
nessa área, mesmo já tendo projeto e orçamento para a construção do edifício.
Projeto da penitenciária pública de Curitiba em 1880.
Acervo: Ernani Straube
Próximo dali ficava a chácara de Paulo Leindorf, construiu uma casa de alvenaria no
estilo europeu entre a Estrada do Assungui e o Rio Belém, casa esta comprada posteriormente por Otto Boutin. Nos anos 40, todo o terreno do São Lourenço foi adquirido pela firma Albano
Boutin e Cia Ltda., que transferiu para lá sua fábrica de adubos.
Além do curtume, da fábrica de cola e adubo, instalou-se também nas proximidades o
Frigorífico Blumenau. No relato de Maria Helena Bugalski, antiga moradora da região, vemos
uma descrição desse contexto:
[Eu] via a boiada passar, sendo tocada a pé a partir do Cerro Azul, vindo pela rua
Assungui, atualmente Wadislau Bugalski. A boiada seguia para o matadouro que ficava
na rua Mateus Leme, cujo proprietário era Albano Zoski, que também era dono da
fábrica de lingüiça Blumenau. [4]
No ano de 1970 a represa do São Lourenço, então propriedade da fábrica de Adubos
Boutin, estourou, causando inundação em toda a região e, devido aos prejuízos
causados,ocasionou o fechamento desta e de outras fábricas do local.
Após a inundação causada pelo estouro da represa, implanta-se o projeto do Parque São
Lourenço, com a construção de um lago artificial que serviria de regulador de vazão das águas
do Rio Belém e aproveitamento dos arredores para a construção de um parque municipal
abrangendo setores de recreação, educação, controle de inundações, poluição e paisagismo. [5] Os
terrenos que compreendiam o Tanque São Lourenço e a fábrica de cola foram vendidos à
Prefeitura Municipal de Curitiba, que, em 1972 implementa o Parque São Lourenço.
O projeto ainda previa um Centro de Criatividade para atender a população interessada no
aprendizado artístico, com atividades nas áreas de artes plásticas, teatro, música, cinema,
literatura e arquitetura, o qual foi inaugurado em 1973.
Em 1980, o parque recebe diversas melhorias, como a construção de novos portais,
ampliação de vagas de estacionamento, churrasqueiras, bancos e mesas. Além disso, a antiga
roda d’água que existia no local foi ativada, para isso aumentou-se o nível do lago na parte
superior, trazendo a canaleta de água por um caminho de pedras, fazendo a roda girar. O
bondinho de burro [6] também foi trazido do Parque Barigui e implantado no Parque São
Lourenço.
No ano de 1994, a Prefeitura da cidade construiu um muro de contenção no lago para
remodelação das suas margens e controle do nível de água.
Em 1998, o Parque recebe um espaço cultural dedicado ao artista plástico Erbo Stenzel:
a Casa Erbo Stenzel. A casa de madeira foi relocada da Travessa General Francisco Lima e
Silva, no bairro São Francisco, para o Parque São Lourenço. A casa contém várias salas
dedicadas ao artista plástico, réplicas de obras e fotos de Stenzel.
No ano de 2002, a prefeitura realizou o desassoreamento do lago e instalou um
equipamento para controle da água em decorrência da morte das carpas. Também no ano de
2002, moradores promoveram uma festa em defesa da recuperação do Rio Belém, soltando
peixes no lago do parque. O lago e suas margens servem de moradia para carpas, gansos,
marrecos, galinhas-de-angola e carneiros.
Desde a sua implantação, o parque é palco de várias obras de desassoreamento,
revitalização, limpeza de esgoto do lago, bem como de festas comunitárias que visaram resgatar
a história e religiosidade do bairro, feiras e ações de conscientização ambiental. Um exemplo é o
evento: Abraço ao Rio Belém e ao Parque São Lourenço, realizado anualmente desde 2000,
organizado pela Associação dos Moradores e Amigos do São Lourenço, envolvendo cerca de
3.500 alunos provenientes de escolas parceiras.
A paisagem, antes constituída por um rio, uma estradinha, sítio e armazém passou a ser
um lago envolto por diversas atrações de lazer, ao lado de uma rua asfaltada e movimentada.
Paisagem esta que contribuiu para a valorização imobiliária do bairro. Desde a instalação do
parque o perfil do entorno mudou. Segundo uma entrevista do corretor César Lopes para o jornal
Gazeta do Povo em 2010: “Havia muitas casas antigas e terrenos desocupados. O parque
colaborou para atrair empreendimentos de alto padrão, como vem acontecendo no entorno de
parques novos, como o Tingui e o Tanguá”. [7]
Vistas atuais do Parque São Lourenço, com bosque nativo e lago do Rio Belém.
Notas:
[1] MACHADO, Francelina. São Lourenço - entrevista concedida a Leonidas Boutin. Curitiba: janeiro de 1984. Casa
da Memória.[2] Idem.
[3] STRAUBE, E. A penitenciária em Curitiba. Revista da Academia Paranaense de Letras. Curitiba: Departamento de Imprensa Oficial do Paraná, 1998. nº 38. p. 119-125.
[4] BONAMIGO, Zélia Maria. Tropeiros das Colônias em Curitiba e Almirante Tamandaré-PR - História,
Trocas e Dádivas. Curitiba: Boletim do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, V. 62, 2010. p. 33.
[5] IPPUC: Parque São Lourenço. Casa da Memória. Curitiba.
[6] O bondinho de burro é uma atração, nele visitantes do parque passeavam por meio de uma charrete puxada por
mulas. A atração, embora estivesse no projeto inicial do Parque São Lourenço, só foi trazida posteriormente, estando
antes concentrada no Parque Barigui.Fotos: Gabriel Gallarza / Acervo: Casa da Memória - FCC
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